CCJ aprova nova regra para remuneração de mediadores e conciliadores não concursados

CCJ aprova nova regra para remuneração de mediadores e conciliadores não concursados

Texto segue para análise do Senado Federal

Vinicius Loures/Câmara dos Deputados

Discussão e votação de propostas legislativas. Dep. Helder Salomão (PT - ES)
Helder Salomão, relator da matéria na CCJ

A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 223/23, que assegura remuneração a mediadores e conciliadores nos casos em que o número de audiências realizadas por eles exceder o percentual fixado pelo tribunal para atuação em processos para os quais tenha sido deferida a gratuidade da Justiça. O texto segue para análise do Senado Federal.

O Código de Processo Civil (CPC), que é alterado pela matéria, define o conciliador como aquele que atua preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes, podendo sugerir soluções para o conflito. Já o mediador atua preferencialmente nos casos em que há vínculo anterior entre as partes e será responsável por auxiliar aos interessados a compreender as questões e os interesses em conflito.

O projeto aprovado é de autoria do deputado licenciado Paulo Teixeira (PT-SP), que hoje é ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar. O texto  recebeu parecer favorável do relator no colegiado, deputado Helder Salomão (PT-ES).

“A lei vigente nada dispõe a respeito da remuneração dos mediadores e conciliadores quando da atuação em audiências de processos com gratuidade de Justiça que excederem o limite fixado pelo tribunal”, observou o relator.

Percentual de audiências
O autor da proposta explica que, ao promover o credenciamento dos mediadores e conciliadores não concursados, os tribunais devem determinar o percentual de audiências não remuneradas que deverão ser suportadas pelos profissionais a fim de atender os processos nos quais será deferida a gratuidade, devendo ser remunerados pelo trabalho nas demais audiências.

“Indaga-se: o que deve ocorrer caso um mediador atue exclusivamente em processos nos quais há gratuidade? Deve ele ficar sem remuneração? A resposta é negativa, pois a lei determina a remuneração do profissional até mesmo como forma de incentivo aos métodos alternativos de resolução de controvérsias”, afirma Teixeira.

Saiba mais sobre a tramitação de projetos de lei

Reportagem – Murilo Souza
Edição – Ana Chalub

Fonte: Agência Câmara de Notícias

 

 

Supremo valida decreto que revogou norma sobre dispensa sem justa causa

Supremo valida decreto que revogou norma sobre dispensa sem justa causa

Embora tenha decidido que a exclusão de normas internacionais do ordenamento jurídico do Brasil não pode ser mera opção do chefe do Poder Executivo, o Supremo Tribunal Federal, em nome da segurança jurídica, declarou válido o Decreto presidencial 2.100/1996, que comunicava a retirada do país do cumprimento da Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que proíbe a demissão sem justa causa.

No entanto, na mesma decisão, tomada no julgamento de uma ação declaratória de constitucionalidade, a corte estabeleceu que a denúncia de tratados internacionais pelo presidente da República exige a anuência do Congresso Nacional. Esse entendimento vigorará a partir de agora, sendo preservados os atos anteriores.

Além de vedar a dispensa imotivada, a Convenção 158 da OIT prevê uma série de procedimentos para o encerramento do vínculo de emprego. A norma foi aprovada pelo Congresso Nacional e, posteriormente, promulgada pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso. Meses após a promulgação, contudo, o presidente comunicou formalmente à OIT a retirada do Brasil da lista dos países que a haviam assinado.

Na ação, a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) e a Confederação Nacional do Transporte (CNT) defendiam a validade do documento. A inconstitucionalidade do decreto é objeto também da ADI 1.625, cujo julgamento está suspenso para ser concluído em sessão presencial do Plenário.

Risco de retrocesso
No voto que prevaleceu no julgamento, o relator da matéria, ministro Dias Toffoli, afirmou que a exclusão de normas internacionais do ordenamento jurídico brasileiro não pode ser mera opção do chefe de Estado. Como os tratados passam a ter força de lei quando são incorporados às leis brasileiras, sua revogação exige também a aprovação do Congresso.

Segundo Toffoli, apesar dessa exigência, na prática tem havido uma aceitação tácita da medida unilateral. Mas, a seu ver, essa possibilidade traz risco de retrocesso em políticas essenciais de proteção da população, porque a prerrogativa pode vir a recair sobre mandatário de perfil autoritário e sem zelo em relação a direitos conquistados.

Segurança jurídica
No caso concreto da Convenção 158, o STF decidiu manter válido o decreto que a denunciou, em nome da segurança jurídica. A maioria do colegiado acompanhou a proposta do relator para aplicar a tese da inconstitucionalidade da denúncia unilateral de tratados internacionais apenas a partir da publicação da ata do julgamento da ação, mantendo, assim, a eficácia de atos praticados até agora.

Ficaram vencidos os ministros Edson Fachin e Ricardo Lewandowski (aposentado) e a ministra Rosa Weber, presidente da corte, que julgaram inconstitucional o decreto presidencial. Com informações da assessoria de imprensa do STF.

ADC 39

Fonte: https://www.conjur.com.br/2023-jun-19/stf-valida-decreto-revogou-norma-dispensa-justa-causa

Falar mal da empresa nas redes sociais pode levar a demissão por justa causa

Falar mal da empresa nas redes sociais pode levar a demissão por justa causa

Na internet, muitas pessoas tem uma sensação de falsa impunidade, mas a depender do grau ofensivo do comentário publicado, a conduta poderá ser enquadrada como um ato lesivo à honra ou boa fama do empregador

Empregados precisam se lembrar que fazer qualquer tipo de comentário ou endossar críticas pode caracterizar uma falta graveEmpregados precisam se lembrar que fazer qualquer tipo de comentário ou endossar críticas pode caracterizar uma falta grave 

Atualmente, muitas pessoas se sentem livres para compartilhar suas vidas, expressar suas opiniões e até mesmo desabafar sobre suas profissões nas redes sociais. 

No entanto, existe um limite para essa liberdade e funcionários que falam mal da empresa em que trabalham publicamente podem ser demitidos por justa causa 

Segundo o advogado e sócio da área trabalhista do escritório Mattos Filho, Domingos Fortunato, é importante lembrar que, pela internet não ser um ambiente altamente regulado, muitas pessoas tem uma sensação de falsa impunidade.

No entanto, os empregados precisam ter consciência que fazer qualquer tipo de comentário ou endossar críticas pode caracterizar uma falta grave.

“A relação de trabalho é uma relação de confiança entre o empregado e empregador. Com ela, pressupõe-se uma harmonia entre as partes. Ao mencionar ou falar mal do empregador em redes sociais há quebra dessa confiança”, diz. 

Ele cita como exemplo um caso que ocorreu nos Estados Unidos, em 2018, em que uma funcionara da empresa Akima LLC, que trabalha para o governo americano, foi fotografada fazendo um sinal ofensivo para comitiva de Donald Trump.

No Brasil, não existe uma regulamentação legal a respeito dos limites para postagens, declarações ou comentários sobre o empregador em redes sociais e ambientes na internet. Até por isso, muitas empresas definem regras de conduta e certos limites aos empregados nas interações em redes sociais que envolvam seu nome, marca e produtos.

Porém, o sócio da área trabalhista do escritório Demarest Advogados, Celso Báez do Carmo Filho, explica que a depender do grau ofensivo do comentário publicado, a conduta poderá ser enquadrada como um ato lesivo à honra ou boa fama do empregador e, com isso, caracterizar falta grave passível de demissão por justa causa, conforme previsto no artigo 482 da CLT.

“Como regra geral, qualquer manifestação por parte de um indivíduo que acarrete danos ou ofensas a terceiros acarretará sua responsabilização nos âmbitos civil e penal. A lógica é a mesma na relação de trabalho, cabendo ainda a aplicação de eventuais sanções disciplinares nos termos da lei”, afirma.

Além disso, o advogado esclarece que demitir um empregado que critica seu emprego publicamente não consistiria em violação ao direito de expressão, mas em direito potestativo do próprio empregador, inclusive em virtude da quebra de confiança.

“Ainda que o direito à liberdade de expressão seja garantido, esse direito não é ilimitado. Como em qualquer circunstância, ofensas verbais a qualquer pessoa física ou jurídica pode acarretar a responsabilização do ofensor. Essa lógica não é diferente na relação de emprego”, comenta.

A lei também vale tanto para o empregado quanto para o empregador.

Se uma das partes cometer um ilícito, isso gera direito a uma reação jurídica. No caso do empregador de rescindir o contrato por justa causa e no caso do empregado de pedir danos e uma eventual indenização por danos morais, caso a empresa publique ou torne pública essa situação”, diz Fortunato. 

É importante lembrar que a lei não é limitada apenas ao âmbito digital, o que temos agora é, na verdade, que os fatos que aconteciam no presencial passam a ocorrer virtualmente. Dessa forma, a legislação regula uma conduta que pode ocorrer em ambos os lugares.  

Por Luiza Palermo da CNN

Fonte: https://www.cnnbrasil.com.br/economia/falar-mal-da-empresa-nas-redes-sociais-pode-levar-a-demissao-por-justa-causa-entenda/

Foto: Elisa Ventur/Unsplash

 

TRT18: Primeira Turma mantém justa causa de motorista que se apresentou no trabalho após ingerir bebida alcoólica

TRT18: Primeira Turma mantém justa causa de motorista que se apresentou no trabalho após ingerir bebida alcoólica

A 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (GO) manteve a dispensa por justa causa de um motorista em Uruaçu (GO) que, antes de entrar para a jornada de trabalho, testou positivo para o bafômetro realizado, aleatoriamente, na entrada da empresa. O colegiado acompanhou o voto do relator, desembargador Welington Peixoto, ao apontar que, havendo confissão do trabalhador quanto ao teste positivo e quanto ao fato de ter bebido no dia anterior, resta comprovada a causa eficiente a justificar o rompimento por justa causa.

Para o desembargador, o ato faltoso relativo à ingestão de bebida alcoólica por motorista de caminhão, que opera em mina de subsolo, importa em gravidade capaz de impossibilitar a continuidade da prestação dos serviços. Peixoto aponta que a empresa não pode permitir que o motorista faça uso de substância alcoólica, considerando que deve zelar pela integridade física do empregado durante a jornada de trabalho, já que a própria atividade envolve risco de acidente.

Entenda o caso

O motorista da mineradora foi desligado da empresa por justa causa após o teste de bafômetro, feito aleatoriamente no local de trabalho, apresentar resultado positivo. A empresa aplicou a pena máxima ao trabalhador por embriaguez em serviço. Argumentou que em cumprimento ao procedimento padronizado na empresa, após a primeira testagem, uma contraprova foi solicitada com a presença do coordenador da mineradora e novamente, foi positivo, apontando teor alcoólico muito acima do permitido, em evidente embriaguez no serviço.

A mineradora alegou que, se ele não tivesse sido submetido aleatoriamente ao teste de bafômetro, teria trabalhado sob forte influência de álcool, o que não poderia ser chancelado. Para a mineradora, no exercício de suas atividades laborais rotineiras, o motorista, operando equipamento automotor pesado, estava obrigado a respeitar as normas do Plano de Trânsito da unidade, sendo o responsável direto pela condução do equipamento em região de mina, na qual transitam outros equipamentos e muitas pessoas. “Neste ponto, não se pode olvidar do rigor consubstanciado no art. 276 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) e no art. 1º do Decreto nº 6.488/2008, que impõem a “tolerância zero” ao disciplinar que qualquer concentração de álcool enseja infração ao CTB”, concluiu a empresa.

O trabalhador acionou a Justiça do Trabalho para reverter a justa causa, porém o juízo de primeiro grau manteve o rompimento contratual. O trabalhador, então, recorreu ao TRT e alegou que não houve confissão, mas tão somente esclarecimento a respeito de sua rotina no dia anterior. Ressaltou que não se trata de um empregado viciado em álcool ou mesmo que bebeu e foi trabalhar, mas que estava no seu dia de folga e confraternizou com sua família no dia anterior. Segundo o motorista, parou de beber por volta das 20 horas e foi para o trabalho às 7h da manhã do dia seguinte.

Para o motorista, esse tempo seria suficiente para descansar e trabalhar normalmente no dia seguinte. Alegou que foi submetido a dois testes na portaria da empresa, sendo o primeiro positivo e o segundo negativo, não havendo comprovação efetiva de embriaguez. E que a mineradora sequer apresentou os testes realizados, ônus que lhe competia. Pediu a reversão da justa causa e o pagamento das verbas rescisórias pertinentes.

Para o relator, o motorista confirmou em depoimento ter assoprado o bafômetro, teste que confirmou a embriaguez, além de admitir ter bebido no dia anterior. Também confirmou que os testes no bafômetro eram frequentes, sendo realizados na barragem todos os dias e, na portaria da empresa, aleatoriamente, por sorteio. “Ou seja, estava plenamente ciente desta possibilidade”, afirmou o relator.

Peixoto entendeu que a mineradora não tem o controle das horas de folga do trabalhador, mas, trabalhando como motorista de equipamento automotor pesado, o funcionário deve se resguardar para comparecer ao trabalho em plenas condições de exercer sua função, a qual envolve riscos de acidente. “Dessa forma, se o funcionário ingeriu bebida alcoólica até as 20h e, o teste do bafômetro foi positivo às 7h da manhã, não se pode apontar erro no equipamento, apenas a não absorção completa da quantidade de álcool ingerida no dia anterior, talvez por excesso de álcool ou, por intolerância do próprio organismo”, apontou o relator.

O desembargador entendeu que diante das provas apresentadas, a empresa ficou livre  encargo de comprovar a regularidade do rompimento do contrato por justa causa. Peixoto manteve a sentença e o rompimento contratual por justa causa.

Processo 0010743-56.2022.5.18.0201

JA/CG/FV

Fonte: https://www.trt18.jus.br/portal/justica-do-trabalho-mantem-justa-causa-de-motorista-que-se-apresentou-no-trabalho-apos-ingerir-bebida-alcoolica/#:~:text=A%201%C2%AA%20Turma%20do%20Tribunal,aleatoriamente%2C%20na%20entrada%20da%20empresa.

STJ dá salvo-conduto para que homem com ansiedade plante sua própria maconha

STJ dá salvo-conduto para que homem com ansiedade plante sua própria maconha

O ministro Rogerio Schietti Cruz, do STJ, no julgamento do recurso em Habeas Corpus nº 178.057, concedeu um salvo-conduto para que um homem possa plantar pés de maconha sem que lhe seja imposto qualquer constrangimento repressivo penal.

No pedido feito ao Superior Tribunal de Justiça, a defesa alegou que o homem sofria ameaça ao seu direito de locomoção em decorrência de decisão tomada pelo TJ-PR (Tribunal de Justiça do Paraná), solicitando, em síntese, a concessão de salvo-conduto para que pudesse plantar, cultivar, transportar e extrair artesanalmente o óleo da cannabis, a fim de viabilizar o seu tratamento médico.

A defesa afirmou que ele, desde criança, foi diagnosticado com ansiedade
generalizada e sempre conviveu com graves dores de estômago e distúrbios do sono dela decorrentes. No ano de 2020, iniciou tratamento com cannabis medicinal, prescrito e acompanhado por médico.

Segundo a defesa, mesmo prescrevendo o óleo de origem caseira, seu
médico também manteve a prescrição de flores de cannabis in natura e extratos de THC e estes últimos sequer estão disponíveis no mercado nacional ou internacional, e apenas podem ser obtidos através do cultivo caseiro.

Ao final, pediu que fosse determinado às autoridades que se abstivessem de proceder à sua prisão, repreendê-lo, apreender e destruir as respectivas sementes ou plantas, bem como demais insumos oriundos e conexos à sua produção, autorizando-o a plantar, cultivar, transportar e extrair artesanalmente o óleo da cannabis, remeter para análise, bem como demais atos relacionados ao seu tratamento, com o fim exclusivamente medicinal, inclusive determinando o número de plantas em estágio vegetativo e florativo que pudesse cultivar, uma vez que estavam devidamente comprovados os requisitos legais e jurisprudenciais para tanto, em especial a prescrição médica e relatório médico comprovando a melhora do seu quadro de saúde, bem como a urgência e a necessidade do tratamento em razão da inexistência de outros meios de obtenção do tratamento.

No seu pedido, a defesa esclareceu o número de plantas que pretendia cultivar, juntando, inclusive, laudo subscrito por um engenheiro agrônomo.

Já no STJ, o ministro Schietti — após citar algumas decisões do próprio tribunal superior reconhecendo a possibilidade de concessão de Habeas Corpus preventivo (salvo-conduto), a fim de obstar a repressão criminal do cultivo de cannabis sativa para fins medicinais — afirmou que o pedido estava acompanhado de prescrição médica, de uma autorização da Anvisa para importação do canabidiol (a própria agência de vigilância sanitária reconheceu a necessidade do paciente fazer uso do produto) e em laudo de engenheiro agrônomo atestando que, conforme a prescrição médica para a produção de óleo e uso vaporizado, seria necessário a produção de 96 a 57 por ciclo a cada três meses, totalizando de 354 a 238 plantas por ano, adicionados as dez plantas clonais.

Assim, o ministro concluiu a sua decisão favoravelmente à defesa, concedendo um salvo-conduto para autorizar o plantio e o cultivo, para extração das propriedades medicinais voltadas ao uso terapêutico próprio, de 96 a 57 plantas por ciclo a cada três meses, totalizando de 354 a 238 plantas por ano, adicionados as dez plantas clonais, proibindo qualquer medida de repressão criminal decorrente das condutas, estando, evidentemente, vedada a comercialização, doação ou transferência a terceiros da matéria-prima ou dos compostos derivados da erva, ressaltando, ainda, que o benefício não impedia o controle administrativo do processo de plantio, cultura e transporte da substância, fora dos termos especificados.

Esta decisão monocrática do ministro Schietti, datada do último dia 19 de maio, mostra, com rara sensibilidade jurídica, e sem ativismo judicial, como deve ser tratada a questão das drogas pelos nossos juízes e tribunais, inclusive pelo STF (Supremo Tribunal Federal), em cuja pauta está o Recurso Extraordinário nº 635.659, que trata exatamente da descriminalização do porte de maconha para consumo próprio.

Aliás, este debate em relação às drogas deveria fugir do lugar-comum — criminalização versus descriminalização — e avançar, no sentido de que se discuta a própria legalização das drogas, de toda e qualquer droga, e não somente do porte e do consumo, mas da produção e do comércio.

Em primeiro lugar, é preciso atentar que a partir do instante em que a produção e o comércio de drogas passem a ser regulamentados, controlados e fiscalizados pelo estado, a tendência será a eliminação gradativa do mercado ilegal do tráfico (seja a produção, seja o comércio). Transferindo-se este rendoso mercado de bilhões de dólares para o estado e retirando-o das mãos do crime organizado, ficará este órfão, forçando-o a deixar este tipo de ilícito, extremamente violento. O estado passaria, então, a regular o mercado, controlando as vendas, a produção, a propaganda, os locais de consumo, etc.

Com a eliminação do tráfico ilícito, ainda que a médio prazo, haveria induvidosamente uma diminuição vertiginosa da prática de outros delitos conexos, pois muitos usuários ou dependentes (é preciso fazer esta distinção) furtam, roubam e até matam para conseguir a droga ilícita, vendida a preços mais caros no mercado clandestino.

Ademais, sendo enorme a procura por drogas ilícitas e o mercado sem nenhuma regulação estatal, a tendência é que o valor da droga (nem sempre de boa qualidade) seja alto, o que leva o consumidor a praticar crimes para conseguir dinheiro, a fim de sustentar o seu vício (no caso dos dependentes químicos). É possível que a regulação do comércio, além de garantir produtos sem impurezas e, portanto, menos nocivos à saúde, estabelecesse preços mais baixos para as drogas em geral. É o que ocorre, por exemplo, com o tabaco e o álcool, cujos usuários (dependentes químicos ou não) não precisam recorrer ao furto ou ao roubo para consumirem a droga lícita.

Ao assumir esta responsabilidade, o estado passaria, consequentemente, a se comprometer em prestar todos os esclarecimentos à população acerca dos efeitos do uso de drogas, como hoje é feito com as referidas drogas lícitas. Ao contrário, com a atual política proibicionista, dificulta-se enormemente que adolescentes e jovens tenham acesso a informações corretas e científicas sobre o assunto. Ignorantes, o risco para estas pessoas é muito maior. Para eles, a aflição é terrível, e o sofrimento para a família, devastador. Nesta questão, a informação séria e a boa educação são fundamentais.

O sociólogo argentino Alberto Calabrese observa que “a proibição tem apenas 55 anos e decorre de uma resolução das Nações Unidas de 1961″. “Ou seja, cocaína, morfina, heroína e outros tipos de substâncias psicoativas não foram proibidas desde que Adão e Eva deixaram o paraíso, ainda que possamos fazer uma comparação entre a saída do paraíso e o consumir a única coisa que não podia ser consumida. Isso demonstra que as drogas cumpriram outras funções: controle populacional e um grande negócio. Um negócio que movimenta dois bilhões de dólares por ano. Ou seja, uma estrutura difícil de desativar porque supõe e envolve muitos interesses. Formalmente, todos dizem que a questão deve ser encerrada, mas a realidade é que esta questão hoje tem tal importância na produção econômica, que favorece a muitos para que a produção permaneça em termos de negócios.” [1]

O neurocientista americano, da Universidade de Columbia, Carl Hart, crítico veemente da política antidrogas de seu país, adverte que “nossas políticas para drogas se baseiam, em grande parte, em ficção e desconhecimento”. “A farmacologia — ou, em outras palavras, os reais efeitos das drogas — já não desempenha papel tão relevante quando se estabelecem essas políticas.” [2]

Também não se pode negar que o proibicionismo leva à marginalização e à estigmatização do usuário ou dependente, dificultando (e até impedindo) que o sistema público de saúde chegue até ele, facilitando a proliferação de doenças, especialmente entre os usuários de drogas injetáveis. Aqui, muito mais eficaz, é uma política realmente séria de redução de danos. A propósito, “os chamados Programas de Redução de Riscos são, e têm sido, o marco das diversas abordagens e programas de atuação que nestas últimas décadas têm procurado dar uma resposta às diferentes problemáticas associadas às formas de consumo de determinadas drogas, às patologias concomitantes e às condutas de risco”. “A redução de danos converteu-se numa alternativa às abordagens baseadas na abstinência e focadas em um modelo punitivo, seja por meio do paternalismo médico, seja pela aplicação da lei.” [3]

É preciso também refletir exatamente a quem interessa efetivamente a proibição das drogas. O mercado de drogas ilegais envolve bilhões de dólares por ano. Será que esta política de combate às drogas não serve para que alguns países continuem a estabelecer uma relação de domínio absoluto sobre outros, especialmente aqueles ditos periféricos, produtores da droga? Com a legalização, o dinheiro que hoje vai para aqueles países consumidores (que vendem armas e tecnologia bélica e de inteligência a propósito de combater o narcotráfico) ficaria no país produtor, a partir da cobrança de impostos, por exemplo.

A atual política criminal de drogas, liderada estrategicamente pelos Estados Unidos, comprova o seu próprio fracasso, com a superpopulação carcerária e um processo crescente de criminalização da pobreza. Este país, sem dúvidas, foi o “gerador e promotor do movimento antidrogas e do respectivo discurso, e porque se colocou sempre na vanguarda ‘da luta contra os demônios’ do tráfico internacional de drogas.” [4].

Um outro aspecto relevante sobre o tema é o jurídico. Definitivamente, quem consome drogas não afeta a saúde de outrem, mas a sua própria (quando afeta…). Ora, em um Estado democrático de Direito não é possível punir uma conduta que não atinja terceiros, razão pela qual não se pune, por exemplo, a autolesão ou a tentativa de suicídio, estando tais condutas inseridas dentro da esfera de privacidade e de autonomia do sujeito, sendo, portanto, ilegítima a intervenção do direito, seja para criminalizar, seja para tornar ilegal a produção, o consumo e o comércio das drogas.

Quem atua no sistema jurídico precisa enxergar para além do direito. A pessoa, ao longo da vida, depara-se com graves questões existenciais e adversidades próprias da existência humana, levando-a a tentar suprir a sua incapacidade de enfrentar tais questões com o uso de drogas, que é um dos meios para se chegar à “felicidade plena”. Ora, como pode o estado punir esta busca, ainda que possa ser uma procura vã e nociva, do ponto de vista individual? É preciso que se respeite a opção e as escolhas de cada um, desde que tais opções e escolhas não venham a atingir outrem.

Como escreveu Freud, “existem muitos caminhos que podem levar à felicidade, tal como é acessível ao ser humano, mas nenhum que a ela conduza seguramente”. Um deles é a droga: “Mas os métodos mais interessantes para prevenir o sofrimento são aqueles que tentam influir no próprio organismo. Pois todo sofrimento é apenas sensação, existe somente na medida em que o sentimos, e nós o sentimos em virtude de certos arranjos de nosso organismo. O método mais cru, mas também mais eficaz de exercer tal influência é o químico, a intoxicação. Não creio que alguém penetre inteiramente no seu mecanismo, mas é fato que há substâncias de fora do corpo que, uma vez presentes no sangue e nos tecidos, produzem em nós sensações imediatas de prazer, e também mudam de tal forma as condições de nossa sensibilidade, que nos sentimos incapazes de acolher impulsos desprazerosos. Os dois efeitos não só acontecem ao mesmo tempo, como parecem intimamente ligados.” [5]

Alberto Calabrese nota que em relação ao usuário das drogas, o primeiro contato tem a ver com o prazer”. “Ele não consome pensando que vai consumir para que isso lhe faça mal. Ele decide consumir aquilo porque acha que vai te fazer bem ou vai te dar prazer. Que depois ele se equivoque porque tem uma relação distorcida com aquele objeto ou substância, é outra história. Mas a primeira coisa que você vai procurar é sustentar o prazer.” [6]

Por que não se proíbe o uso de bebida alcoólica ou do tabaco, drogas comprovadamente danosas para a saúde quando usadas de maneira exagerada? A propósito, e como se sabe, quando os Estados Unidos proibiram o consumo do álcool (período conhecido como o da Lei Seca), o aumento da criminalidade urbana foi assustador, especialmente com o surgimento das grandes organizações criminosas [7].

É preciso que fiquemos atentos para os chamados “empresários da moral, uma espécie de mediador entre os sentimentos públicos e a criação da lei, e, principalmente, para os empresários da repressão, exemplificados nas forças de segurança que se ocupam de implementar a política criminal” [8].

O proibicionismo só atrai ainda mais as pessoas (principalmente as mais jovens) para o consumo que, por sua vez, sendo ilegal, leva os usuários a uma situação de marginalização e de estigmatização, inserindo-os no sistema prisional que, como é notório, longe de ressocializar, criminaliza e violenta ainda mais. É um verdadeiro círculo vicioso. A questão das drogas não pode ser resolvida pelo sistema de justiça criminal e pelas agências punitivas: polícia, Ministério Público, Poder Judiciário. Outros atores devem ser chamados: assistentes sociais, pedagogos, médicos, psicólogos, família, igrejas, escolas, etc. A legalização, enfim, teria este outro efeito positivo: a descarcerização.

Bem a propósito, a afirmação de Maria Lúcia Karam: “Talvez o caminho seja mais árduo. A fantasia é sempre mais fácil e mais cômoda. Com certeza é mais simples para os pais de um menino drogado culpar o fantasma do traficante, que supostamente induziu seu filho ao vício, do que perceber e tratar dos conflitos familiares latentes que, mais provavelmente, motivaram o vício. Como, certamente, é mais simples para a sociedade permitir a desapropriação do conflito e transferi-lo para o Estado, esperando a enganosamente salvadora intervenção do sistema penal” [9].

Para concluir, uma pergunta primeira: a proibição tem surtido algum efeito positivo, sob algum aspecto? E tem gerado efeitos negativos? Vamos, então, refletir sobre tais consequências e avaliar se não é chegada a hora de procurarmos uma política alternativa, uma terceira via, ao menos mais democrática, mais racional, mais humana e mais eficaz.

Depois, valho-me da palavra de Freud, ainda que em outro contexto: “Em nosso país existe, desde sempre, um verdadeiro furor prohibendi (mania de proibição), uma inclinação a tutelar, intervir e proibir que, como sabemos, não trouxe exatamente bons frutos. Pode-se observar isto: onde há poucas proibições, elas são cuidadosamente respeitadas; onde o indivíduo depara-se com proibições a todo momento, sente praticamente a tentação de ignorá-las. E não é preciso ser um anarquista para ver que leis e regulamentos não podem, por sua origem, ter um caráter de santidade e inviolabilidade, que muitas vezes são deficientes no conteúdo e ofensivos ao nosso sentimento de justiça, ou assim se tornam após algum tempo, e que, dada a vagareza das pessoas que dirigem a sociedade, frequentemente não há outro meio de corrigir tais leis inadequadas senão infringi-las resolutamente. Também é aconselhável, quando se quer que seja mantido o respeito às leis e regulamentos, não promulgar nenhuma cuja obediência ou inobservância seja difícil de controlar” [10].

Texto escrito por Por Rômulo de Andrade Moreira

Fonte: https://www.conjur.com.br/2023-jun-13/romulo-moreira-stj-autoriza-homem-cultivar-cannabis2

[1] CALABRESE, Alberto. Disponível em: https://www.revistaajo.com.ar/notas/4232-el-unicornio-azul-no-nos-salvara-de-las-drogas.html. Acesso em 06 de junho de 2023.

[2] HART, Carl, Um preço muito alto, Rio de Janeiro: Zahar, 2014, p. 310.

[3] MARKEZ, Iñaki, PÓO, Mónica e ETXEGOIEN, Rebeca, “Nuevos tiempos, nuevas políticas, nuevos modelos de intervención: disminución de riesgos”, capítulo do livro Drogas: cambios sociales y legales ante el tercer milenio, Madrid: Dykinson, 2000, p. 273.

[4] OLMO, Rosa del, “Las drogas e sus discursos”, Direito Criminal, Vol. 05, Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 121.

[5] FREUD, Sigmund, Obras Completas, Volume 18, O Mal-Estar na Civilização, Novas Conferências Introdutórias à Psicanálise e Outros Textos, São Paulo: Companhia das Letras, 2010, páginas 32, 33 e 42.

[6] CALABRESE, Alberto. Disponível em: https://www.revistaajo.com.ar/notas/4232-el-unicornio-azul-no-nos-salvara-de-las-drogas.html. Acesso em 06 de junho de 2023.

[7] A Lei Seca vigorou nos Estados Unidos entre os anos 1920 a 1933. Neste período, mais exatamente no ano de 1927, Sigmund Freud escreveu um texto intitulado “O Futuro de uma Ilusão”, abordando a questão religiosa. Em determinado trecho, afirmou que “o efeito das consolações religiosas pode ser igualado ao de um narcótico”, ilustrando exatamente com o que então ocorria nos Estados Unidos, a Lei Seca. Escreveu ele: “Lá se procura — sob clara influência do domínio das mulheres — privar os indivíduos de toda substância que produz embriaguez, estímulo ou prazer, e saturá-los do temor a Deus, como compensação. Não precisamos perguntar como também terminará esse experimento”. (Obras Completas, Volume 17, Inibição, Sintoma e Angústia, o Futuro de uma Ilusão e Outros Textos, São Paulo: Companhia das Letras, 2010, p. 291).

[8] OLMO, Rosa del, “Las drogas e sus discursos”, Direito Criminal, Vol. 05, Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 121.

[9] Maria Lúcia Karam, De Crimes, Penas e Fantasias, Rio de Janeiro: LUAM, 1991, p. 67.

[10] “A Questão da Análise Leiga: Diálogo com um Interlocutor Imparcial (1926)”, Obras Completas, Volume 17, São Paulo, Companhia das Letras, 2014, 1ª. edição, 1ª. reimpressão, páginas197/198.

 

Fonte: https://www.conjur.com.br/2023-jun-13/romulo-moreira-stj-autoriza-homem-cultivar-cannabis2

A Justiça do Trabalho precisa pedir perdão. E mudar

A Justiça do Trabalho precisa pedir perdão. E mudar

TRABALHO CONTEMPORÂNEO

Por Otavio Torres Calvet

Inspirado pelo excelente artigo do colega Marcel da Costa Bispo Roman publicado aqui nesta ConJur, acatei o desafio de dialogar e retomar minha coluna semanal, após um longo período de imersão reflexiva sobre o mundo jurídico, e trabalhista, em nosso país.

O entendimento do STF, para preservar os julgamentos vinculantes efetuados no sentido de que há outras formas de trabalho dignas, que não o vínculo de emprego, e licitude de terceirização em atividade-fim, tem gerado decisões que retiram a competência da Justiça do Trabalho para analisar eventual fraude na contratação de trabalhadores, mesmo que a causa de pedir e o pedido sejam de reconhecimento de vínculo de emprego.

O sentimento geral é de esvaziamento da Justiça do Trabalho, já que o futuro das relações trabalhistas, conforme consenso, não será a utilização da roupagem jurídica do vínculo de emprego. As novas formas de trabalhar pedem outro tipo de regulação.

E por qual motivo precisamos pedir perdão? Porque o verdadeiro culpado por este resultado somos nós, a comunidade jurídica trabalhista, nós, usuários da Justiça do Trabalho.

O primeiro grande erro que cometemos foi tratar o conflito social capital-trabalho sempre pelo viés da luta de classes. Instigamos a litigiosidade, os interesses antagônicos, demonizamos os empresários, desconfiamos dos empreendedores, maldizemos os investidores e, por outro lado, enaltecemos a hipossuficiência a ponto de transformá-la em verdadeira incapacidade.

Sim, chegamos ao ponto de entender que um trabalhador empregado não pode fazer escolhas dentro da relação de emprego, que ele deve ser protegido dele mesmo. Viramos absolutistas do princípio da proteção.

Fomentamos um estado de coisas para manter viva a chama original do Direito do Trabalho e, com isso, infantilmente, esquecemos que sem capitalismo simplesmente não existe relação de emprego. Aviltamos nosso garantidor, o empresário. Por isso, vai o primeiro pedido de perdão.

Segundo, perdemos o bonde da história quando relegamos ao segundo plano as demais relações de trabalho, priorizando a relação de emprego como o eldorado da proteção trabalhista, entendendo que qualquer regulamentação diferente seria precarização.

Qualquer tentativa de concessão de direitos trabalhistas mínimos para novas formas de contratação, qualquer modificação nos sacrossantos direitos estabelecidos na CLT, qualquer medida de flexibilização do rígido pacote celetista geravam o mesmo mantra midiático e estigmatizante da precarização.

Com isso, perdemos a melhor oportunidade que surgiu de fortalecermos os dogmas trabalhistas que tivemos, a reforma do Judiciário pela Emenda Constitucional 45 de 2004, que ampliou a competência da Justiça do Trabalho para todo e qualquer tipo de relação trabalhista.

Ao invés de expandirmos o pensamento para novas regulações do trabalho humano, ao invés de admitirmos novos modelos mais leves e flexíveis para a contratação de trabalhadores em diferentes formas de trabalhar, impedimos sequer que houvesse este debate, tachando de neoliberais fascistas quem ousasse pensar diferente.

Jogamos fora, portanto, as demais relações de trabalho que, agora, o STF classifica como relações civis, comerciais ou, pior, de consumo. Perdão.

Em terceiro lugar, perdão, perdão e perdão pelo que fizemos com a reforma trabalhista de 2017. Aqui todo perdão será pouco pelo que a comunidade jurídica trabalhista fez. A ideologia arcaica do trabalhismo brasileiro, o elogio a uma norma outorgada por um ditador (nossa CLT getulista), a resistência explicita à aplicação de um texto legal, inclusive por setores da magistratura, impediu a última tentativa de modernização capaz de salvar a Justiça do Trabalho.

A Lei 13.467 de 2017, que pretendeu refundar, ainda que parcialmente, o Direito e o Processo do Trabalho continha, em seu bojo, todos os valores necessários para uma nova proteção trabalhista: aumento da liberdade sindical com o fim da contribuição compulsória, reforço à negociação coletiva com prevalência sobre a lei, garantia do mínimo existencial trabalhista como norma de ordem pública, intervenção mínima do Poder Judiciário nas negociações, responsabilidade dos atores sociais no uso da Justiça do Trabalho (sucumbência e gratuidade), além de maior possibilidade do exercício da autonomia individual de vontade.

Está tudo lá. Tudo que o momento atual das relações de trabalho exige: proteção do essencial (artigo 611-B da CLT) e liberdade para construção da proteção adequada via negociação com sindicatos (artigo 611-a da CLT).

Poderíamos ter sido maduros, entendido o momento que vivíamos, nos adaptado às mudanças, mas não, ignoramos a realidade e criamos Jornadas, livros, artigos e jurisprudência para impedir a aplicação da nova lei.

Geramos uma insegurança jurídica nunca antes imaginada, tudo por defesa ideológica de um passado que jamais voltará, cada um pensando nos seus interesses próprios, gananciosos em manter aquilo que nos sustenta, como abutres famintos que não se importam de sorver apenas os restos da verdadeira vítima desse sistema: o empreendedor.

Perdão.

E não para por aí. Temos que pedir perdão ao STF. Orgulhosos como julgadores que sabem mais do que os outros, impregnados do sentimento de que apenas nós conseguimos saber o que é uma “Justiça Social”, não acatamos os rumos traçados pela Corte máxima do país, que há muito já apontava para o entendimento que hoje nos atordoa.

Desde os debates acerca dos contratos de natureza administrativa, passando pelos conflitos de competência sobre sucessão trabalhista de empresas em recuperação judicial, o STF vem sinalizando que nosso exagero geraria a perda de competência.

A facilidade com que a Justiça do Trabalho ignora uma lei para atender seus anseios é de fato impressionante. Com dois princípios julga-se tudo a favor dos trabalhadores, no afã de fazer o bem, de corrigir injustiças históricas, de erradicar desigualdades realizando distribuição de renda.

Transformam-se os magistrados em agentes ativos para obtenção de um fim ideológico, garantido uma expiação de culpa para contribuir com os menos favorecidos, obviamente trazendo para o sacrifício apenas o dinheiro alheio.

E essa mutação não é espontânea, mas provocada pela advocacia trabalhista, que formula as teses e postula pretensões no desejo de encontrar um “bom” juiz capaz de ser sensível à causa, que no mundo paralelo de uma justiça ideal (para eles) transforma de forma corajosa uma tese em obrigação, tudo amparado em abstratas considerações sociológicas que, sob a capa jurídica de um pós positivismo distorcido, concretiza o estrago em decisões de beleza estética e conteúdo duvidoso.

Finalmente, para manter o espaço devido deste recorte, perdão a toda sociedade. Erramos e precisamos reconhecer. A Justiça do Trabalho precisa recomeçar, ser humilde em aceitar que as coisas mudaram, que o mundo a sua volta evoluiu. E, como todos sabemos, um organismo que não acompanha a evolução simplesmente se extingue. Ainda dá tempo.

Por último, aos que não concordam com minhas reflexões, que me perdoem. Fatalmente estaremos juntos lá no fim.

 é juiz do Trabalho no TRT-RJ, mestre e doutor em Direito pela PUC-SP e membro da Associação Brasileira de Magistrados do Trabalho (ABMT).

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