STJ: Tribunal concede liminares para permitir cultivo de Cannabis com fim medicinal sem risco de repressão

STJ: Tribunal concede liminares para permitir cultivo de Cannabis com fim medicinal sem risco de repressão

O vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Og Fernandes, no exercício da presidência, deferiu liminares para assegurar que três pessoas com comprovada necessidade terapêutica possam cultivar plantas de Cannabis sativa sem o risco de qualquer medida repressiva por parte das autoridades.

Nos três recursos em habeas corpus submetidos à presidência do tribunal (um deles em segredo de Justiça), os interessados relataram que possuem problemas de saúde passíveis de tratamento com substâncias extraídas da Cannabis, como dor crônica, quadro de transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH), transtorno depressivo recorrente, fobia social e ansiedade generalizada.

Além de juntar aos processos laudos médicos que comprovam as condições relatadas, eles apresentaram autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para a importação excepcional de produtos medicinais derivados da Cannabis.

Custo da importação inviabiliza o tratamento

Apesar dessa autorização, os recorrentes disseram que a importação dos produtos é cara, razão pela qual entraram na Justiça para obter o habeas corpus preventivo (salvo-conduto) e poder cultivar a planta sem o risco de problemas com a polícia.

Inicialmente, todos os pedidos foram rejeitados nos tribunais estaduais. Em um deles, o recorrente afirmou que teria um gasto mensal de cerca de R$ 2 mil com a importação do medicamento.

O Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), que julgou um dos casos, afirmou que a autorização pretendida dependeria de análise técnica que não cabe ao juízo criminal, sendo da Anvisa a atribuição de avaliar a situação do paciente e permitir, ou não, o cultivo da planta para extração das substâncias medicinais.

Documentos comprovaram necessidade dos recorrentes

De acordo com o ministro Og Fernandes, os pedidos foram satisfatoriamente justificados com a apresentação de documentos que atestam as necessidades dos requerentes, como receitas médicas e pareceres farmacêuticos, autorizações para importação e comprovantes de que outros tratamentos não tiveram o mesmo sucesso.

Em dois dos pedidos, os recorrentes também juntaram certificados de curso sobre plantio da Cannabis sativa e extração de substâncias medicinais.

Precedentes admitem cultivo para fins terapêuticos

O vice-presidente do STJ lembrou que os precedentes da corte consideram não ser crime a conduta de cultivar a planta para fins medicinais, diante da falta de regulamentação prevista no artigo 2º, parágrafo único, da Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas). Com esse entendimento, vários acórdãos concederam salvo-conduto para que pessoas com certos problemas de saúde pudessem cultivar e manipular a Cannabis.

Apoiado nessa jurisprudência, o ministro reconheceu a plausibilidade jurídica dos pedidos e considerou que o mais prudente é “resguardar o direito à saúde” dos interessados até o julgamento final dos recursos pelas turmas competentes. Os relatores serão os ministros Ribeiro Dantas e Antonio Saldanha Palheiro e o desembargador convocado João Batista Moreira.

As liminares permitem o cultivo das plantas na quantidade necessária, apenas para tratamento próprio e nos termos das receitas médicas, ficando os órgãos policiais e o Ministério Público impedidos de tomar medidas que embaracem a atividade.

Fonte: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2023/14072023-Tribunal-concede-liminares-para-permitir-cultivo-de-Cannabis-com-fim-medicinal-sem-risco-de-repressao.aspx

Garantias do Consumidor: Os casos Hurb e 123 Milhas – a necessidade de se manter os pés no chão

Garantias do Consumidor: Os casos Hurb e 123 Milhas – a necessidade de se manter os pés no chão

Por Maria Luiza Baillo Targa

A disponibilização de produtos e serviços no mercado de consumo deve ser minuciosamente precedida de pesquisas e estudos que analisem a viabilidade do negócio e os riscos que lhe são inerentes. Antes de realizar ofertas, que muitas vezes são planejadas apenas mirando o presente, é importante que as práticas sejam pensadas para o futuro, especialmente nos casos em que a prestação do serviço ou entrega do produto será realizada em momento muito posterior à data de sua aquisição pelo consumidor. Por essa razão, estratégias de marketing e ofertas promocionais devem refletir situações factíveis, que serão efetivamente cumpridas em momento posterior, sob pena de o risco a ser assumido ser muito grande — e o prejuízo ainda maior. Os casos envolvendo as agências de turismo Hurb (antigo Hotel Urbano) e 123 Milhas ilustram situações de ofertas realizadas sem a necessária análise e reflexão, que causam prejuízos tanto para si quanto para os seus consumidores.

A pandemia da Covid-19 afetou sobremaneira o setor do turismo. Em meio à significativa redução da demanda por viagens domésticas e internacionais, a Hurb optou por utilizar modelo de negócios consubstanciado na oferta de pacotes promocionais com datas flexíveis, possibilitando aos consumidores que adquirissem passagens aéreas e hospedagens sem a necessidade de definir a data da viagem no momento da compra, e sim em momento futuro, desde que encontrados, quando do agendamento, voos e hotéis com tarifas promocionais. Em outros termos, o bilhete aéreo e a reserva da hospedagem adquiridos eram emitidos em data posterior à aquisição. A medida atraiu diversos viajantes e lhe permitiu atingir um volume bruto de mercadorias (GMV) de R$ 1,8 bilhões em 2020 e de R$ 1,9 bilhões em 2021 [1].

A partir da gradativa redução das restrições de viagens e dos riscos de transmissão da Covid-19, os consumidores passaram a agendar seus pacotes. Todavia, o cenário pós-pandemia se mostrou muito diferente daquele em que as vendas foram feitas. Em 2022, o preço médio das passagens aéreas registrou o maior valor na série histórica da Agência Nacional da Aviação Civil (Anac), chegando à quantia de R$ 645, o que corresponde a R$ 126 a mais do que o preço médio de 2019 (R$ 519) [2]. Também os preços das diárias de hotéis sofreram aumento significativo [3]. Ante a discrepância entre os valores recebidos de seus clientes e os preços de voos e hospedagem, a Hurb passou a enfrentar dificuldades no cumprimento das ofertas.

Como consequência, o número de reclamações dos consumidores postulando o cancelamento do contrato e reembolso dos valores, ou o simples cumprimento das ofertas, disparou. Após os requerimentos na plataforma consumidor.gov.br chegarem a 7.000 no primeiro trimestre de 2023, volume ainda maior que todo o ano de 2022 (12 mil) — que já era expressivo —, a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), vinculada ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, determinou a abertura de processo administrativo sancionador contra a agência [4]. E, em maio, por entender que a modalidade de oferta não dá garantias suficientes aos consumidores, determinou a suspensão temporária da venda de novos pacotes com data flexíveis [5] da Hurb [6].

Assim como a mencionada agência de turismo, a 123 Milhas também passou a ofertar passagens e pacotes promocionais com datas flexíveis em meio à crise vivenciada pelo setor do turismo. O viajante, embora tenha de escolher a data da viagem no momento da aquisição do serviço, necessita estar disponível 24h antes e 24h depois da data escolhida, pois a marcação do voo e da hospedagem é realizada pela própria empresa dentro do período de disponibilidade indicado (destas 72h). Ou seja, não há emissão de bilhete de passagem ou reserva de hospedagem na data da compra.

Durante a pandemia, a empresa investiu fortemente no marketing visando divulgar de maneira ampla as suas ofertas, em especial seus pacotes promocionais com datas flexíveis. Foi a maior anunciante do país em 2021, com aporte de R$ 2,37 bilhões na compra de espaço publicitário, e o segundo maior anunciante do país em 2022, com aporte de R$ 1,28 bilhão [7]. E, tal qual a Hurb, a estratégia atraiu muitos consumidores.

Em virtude da dificuldade de cumprir as ofertas dos pacotes com datas flexíveis pelas mesmas razões da Hurb [8], a 123 Milhas, no dia 18 de agosto, comunicou a suspensão da emissão de passagens e pacotes da categoria Promo agendados para os meses de setembro a dezembro de 2023 [9]. Para além da decisão unilateral, que por si só frustra as legítimas expectativas dos consumidores, a empresa somente se comprometeu a oferecer vouchers acrescidos de correção monetária de 150% do CDI, para compra de quaisquer passagens, hotéis e pacotes na própria agência. Ou seja, não possibilita o cancelamento do contrato com a restituição integral dos valores pagos.

Da mesma forma que ocorreu com a Hurb, como era de se esperar, o número de reclamações de consumidores disparou. No site Reclame Aqui, nos últimos seis meses, já foram realizadas 20.133 reclamações contra a empresa [10]. Por seu turno, na plataforma consumidor.gov.br, foram registradas 7.410 reclamações no ano de 2023, sendo que o índice de solução é de apenas 67,3%, justificando que a nota de satisfação com o atendimento seja hoje correspondente a 2,6 de 5 [11].

Os números se justificam — e provavelmente irão aumentar — porque a alteração unilateral do contrato, subtraindo do consumidor a opção de restituição quantia paga e colocando-o em desvantagem exagerada, além de configurar uma cláusula abusiva (artigo 51, II, e IV, do CDC), viola o disposto no artigo 35 do Código de Defesa do Consumidor, o qual refere que, em caso de recusa de oferta, cabe ao consumidor, alternativamente e à sua livre escolha, (1) exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta; (2) aceitar a prestação de serviço equivalente (o voucher); ou (3) rescindir o contrato, com direito à restituição de valores, monetariamente atualizados, além de perdas e danos [12]. No mais, em se tratando de passagem aérea, à luz do disposto no artigo 31, caput, da Resolução 400/2016 da Anac [13], o reembolso somente pode ser convertido em crédito para aquisição de nova passagem se o passageiro concordar com tal providência.

Diante da grande repercussão da questão, a Senacon já encaminhou um pedido de esclarecimentos e cogita, tal qual o fez com a Hurb, instaurar processo administrativo em face da 123 Milhas para o fim de proibir a venda dos pacotes promocionais, além de arbitrar multa ou estabelecer outras penalidades [14].

No dia 29 de agosto, após o ajuizamento de pelo menos 16,4 mil processos judiciais por consumidores, cujos valores envolvidos ultrapassam os R$ 200 milhões [15], a 123 Milhas entrou com pedido de recuperação judicial sob o argumento de que enfrenta crise financeira e que a suspensão dos pacotes promocionais afetou a sua credibilidade perante o mercado, reduzindo drasticamente o volume de vendas. A medida afeta os interesses dos seus clientes ao dificultar a restituição de valores pagos e reparação de eventuais danos, o que denota, mais uma vez, importantes falhas em toda a sua estratégia de vendas.

Os casos da Hurb e da 123 Milhas mostram ser imprescindível que os fornecedores disponibilizem no mercado de consumo serviços viáveis, que possam de fato ser cumpridos, realizando preliminarmente estudos sérios e comprometidos que permitam concluir que o negócio é de fato praticável e não prejudica os direitos dos consumidores. Inclusive, porque a oferta, que engloba a publicidade e informação suficientemente precisas, bem como quaisquer declarações de vontade manifestadas por escrito, vinculam o fornecedor, que está obrigado a cumpri-las, sob pena inclusive de execução específica (CDC, artigos 30, 48 e 84).

Em relação às agências Hurb e 123 Milhas, mesmo que tenha ocorrido uma mudança no cenário pós-pandemia comparativamente ao período em que grande parte dos pacotes promocionais foram vendidos, isto não é capaz de afastar a sua responsabilidade por danos causados aos seus clientes porque não configura hipótese de caso fortuito ou força maior, já que era previsível o aumento dos preços de hospedagens e passagens em decorrência da queda brusca na demanda por viagens, mormente em meio a uma crise de incertezas nos setores do turismo e aéreo.

Acrescente-se que a responsabilidade dos fornecedores se funda no risco-proveito, o que significa que, em virtude do proveito econômico obtido a partir da disponibilização do serviço ou produto no mercado de consumo (bônus), arcam com os riscos inerentes ao seu negócio (ônus). Aos fornecedores é vedado, portanto, colocar no mercado de consumo serviços que sabem ou que deveriam saber que têm alta probabilidade de não serem cumpridos no momento oportuno, e daí exsurge o seu dever de analisar previamente os riscos intrínsecos da sua atividade.

Para as empresas que querem decolar as suas vendas, portanto, vale o alerta: em caso de quaisquer dúvidas na viabilidade de um serviço, é imprescindível manter-se os pés no chão.

Fonte: https://www.conjur.com.br/2023-set-13/garantias-consumo-hurb-123-milhas-necessidade-manter-pes-chao

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[1] HURB. Quem somos. Disponível em: https://www.hurb.com/br/about-us. Acesso em 26 ago. 2023.

[2] FARIAS, Victor; PINHONI, Marina. Preço médio de passagens aéreas bate recorde em 2022 e continua a subir em 2023. G1, São Paulo, 19 maio 2023. Disponível em: https://g1.globo.com/economia/noticia/2023/ 05/19/preco-medio-de-passagens-aereas-bate-recorde-em-2022-e-continua-a-subir-em-2023.ghtml. Acesso em 26 ago. 2023.

[3] Por exemplo, a rede hoteleira da Atlantica, a segunda maior do país, aumentou o valor das diárias em 2022, fechando o ano com faturamento de R$ 1,75 bilhão, 52% mais que no último ano pré-pandemia (SETTI, Rennan. Preços das diárias de hotéis vão subir mais em 2023, diz CEO da Atlantica. O Globo, São Paulo, 10 abr. 2023. Disponível em: https://oglobo.globo.com/blogs/capital/post/2023/04/precos-das-diarias-de-hoteis-vao-subir-mais-em-2023-diz-ceo-da-atlantica.ghtml. Acesso em 26 ago. 2023).

[4] MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E SEGURANÇA PÚBLICA. Senacon abre processo administrativo sancionador contra plataforma Hurb. Disponível em: https://www.gov.br/mj/pt-br/assuntos/noticias/ senacon-abre-processo-administrativo-sancionador-contra-plataforma-hurb. Acesso em 26 ago. 2023.

[5] Em que pese tal medida, a empresa disponibiliza hoje o “pacote de mês fixo”, no qual o viajante apenas escolhe o mês que quer viajar no momento da compra (Todas as informações estão disponíveis no link https://help.hurb.com/hc/pt-br/articles/18407382267411-Como-funciona-o-Pacote-M%C3%AAs-Fixo-). Provavelmente, a estratégia continuará a dar problemas, já que o consumidor permanece condicionado à disponibilidade de tarifas promocionais, o que dá margem a um possível não cumprimento da oferta. No site Reclame Aqui, a atual nota do Hurb é 3.3 de 10, e nos últimos seis meses, já foram realizadas 51.168 reclamações contra a empresa (https://www.reclameaqui.com.br/empresa/hotel-urbano/lista-reclamacoes/). Por seu turno, na plataforma consumidor.gov.br, foram registradas 6.364 reclamações durante todo o ano de 2023, e a nota de satisfação com o atendimento é 1,4 de 5. Além disso, o índice de solução é de apenas 43% (https://consumidor.gov.br/pages/empresa/20150105000046168/perfil). Para maiores informações, ver: PILAR, Ana Flávia. Hurb segue vendendo pacotes flexíveis, apesar da proibição da Senacon. O Globo, Rio de Janeiro, 21 ago. 2023. Disponível em: https://oglobo.globo.com/economia/defesa-do-consumidor/noticia/2023/08/21/hurb-segue-vendendo-pacotes-flexiveis-apesar-da-proibicao-da-senacon.ghtml. Acesso em 26 ago. 2023.

[6] MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E SEGURANÇA PÚBLICA. Senacon suspende vendas de pacotes de viagens flexíveis da Hurb em todo o Brasil. Disponível em: https://www.gov.br/mj/pt-br/assuntos/noticias/senacon-suspende-vendas-de-pacotes-de-viagens-flexiveis-da-hurb-em-todo-o-brasil. Acesso em 26 ago. 2023.

[7] MADUREIRA, Daniele. Venda de passagem sem data gerou crise da 123milhas, dizem especialistas. Folha, São Paulo, 22 ago. 2023. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2023/08/venda-de-passagem-sem-data-gerou-crise-da-123milhas-dizem-especialistas.shtml. Acesso em 27 ago. 2023.

[8] Maiores esclarecimentos estão disponíveis em: https://123milhas.com/imprensa/

[9] O comunicado está disponível no seguinte link: https://123milhas.com/promo123/

[10] RECLAME AQUI. 123milhas. Disponível em: https://www.reclameaqui.com.br/empresa/123-milhas/. Acesso em 27 ago. 2023.

[11] CONSUMIDOR.GOV.BR. 123 milhas. Disponível em: https://consumidor.gov.br/pages/empresa/20170608000585401/perfil. Acesso em 27 ago. 2023.

[12] Saliente-se que a decisão da 123 Milhas também pode violar o disposto no art. 12 da Resolução 400/2016 da Anac, o qual trata do prazo de antecedência mínima para a comunicação de alterações realizadas de forma programada, referindo que, se a informação ocorrer em menos de 72h de antecedência, devem ser oferecidas ao passageiro as alternativas de reacomodação e reembolso integral, cabendo a escolha ao passageiro.

[13] Embora estejam sujeitos a esta Resolução as transportadoras aéreas em si, em se tratando de alteração contratual programada de passagem aérea, possível sua aplicação por analogia.

[14] LOPES, Raquel. Senacon pode abrir processo administrativo contra a 123milhas. Folha, Brasília, 25 ago. 2023. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2023/08/senacon-pode-abrir-processo-administrativo-contra-a-123milhas.shtml. Acesso em 27 ago. 2023.

[15] TIENGO, Rodolfo. 123 Milhas: recuperação judicial pode impactar decisões favoráveis a clientes, diz advogado. G1, Ribeirão Preto, 01 set. 2023. Disponível em https://g1.globo.com/sp/ribeirao-preto-franca/noticia/2023/09/01/123-milhas-recuperacao-judicial-pode-impactar-decisoes-favoraveis-a-clientes-diz-advogado.ghtml. Acesso em 1º set. 2023.

TRT-2: Mulher não consegue provar gravidez e aborto espontâneo na demissão e não será indenizada

TRT-2: Mulher não consegue provar gravidez e aborto espontâneo na demissão e não será indenizada

Por falta de documentação oficial que comprovasse a gestação e o posterior aborto espontâneo, a 5ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2) negou recurso e manteve uma decisão que indeferiu o pedido de indenização do período de estabilidade para uma ex-empregada de um laboratório de Santos (SP) que foi dispensada supostamente durante a gravidez.

Ao ingressar com a ação, a mulher alegou que foi dispensada enquanto estava grávida. No entanto, ao realizar exame médico demissional, o resultado deu inconclusivo para a gestação. Três semanas depois, ela fez um novo exame, de forma particular, que confirmou a gravidez.

A empresa defendeu que não tinha conhecimento da gestação quando dispensou a ex-empregada. O laboratório questionou o fato dela não ter entrado em contato para avisar do resultado do segundo exame, preferindo entrar com a ação para ganhar indenização, sem pedir reintegração.

Segundo consta no processo, a empresa só tomou ciência da gravidez com a citação da ação. O laboratório entrou em contato com ex-empregada para reintegrá-la, o que foi recusado. Em audiência, a empresa ofereceu novamente a reintegração — o que, mais uma vez, foi recusado.

Na sequência, a ex-empregada informou ter sofrido um aborto espontâneo, mas não detalhou a data. Ela apresentou documentos médicos, mas que não detalhavam a data em que o aborto teria ocorrido.

Na ação, a mulher pedia indenização substitutiva relativa ao período gestacional, férias vencidas e proporcionais com respectivo terço, 13º salário, FGTS com acréscimo de 40%, intervalo intrajornada, diferença de aviso prévio, além de indenização por danos morais — entre outros pedidos.

A 4ª Vara do Trabalho de Santos considerou que a recusa da mulher de aceitar a reintegração e buscar apenas a indenização configurou abuso de direito e julgou o pedido improcedente. Os pedidos de intervalo intrajornada e danos morais também foram rejeitados.

Contra recurso da ex-empregada, o laboratório disse ser indevida a indenização, já que ela não cumpriu um requisito imprescindível para o deferimento do pedido: o atestado médico oficial informando a data em que teria ocorrido o aborto.

Relator do recurso, o desembargador Sidnei Alves Teixeira compreendeu que a apresentação do documento médico que atestasse o aborto espontâneo se tornou essencial para a ação. A falta dele comprometeu o pedido feito pela ex-empregada.

“Da análise do processado, infere-se que a demandante não juntou aos autos o atestado médico previsto no artigo 395, da CLT, demonstrando a ocorrência e a data do aborto, documento ao qual reputo como essencial à análise do pleito em exame, na forma do referido dispositivo.”

O magistrado destacou que, mesmo após a concessão de prazo para a apresentação do documento, a mulher limitou-se a juntar relatório médico sem a comprovação.

“Repousando controvérsia quanto à data do aborto, não havendo, em realidade, sequer comprovação documental de sua ocorrência, mantenho a decisão hostilizada que indeferiu o pedido de indenização do período de estabilidade, inclusive no tocante à retificação da CTPS.”

O laboratório foi representado na ação pelo advogado Luiz Otávio de Almeida Lima e Silva, do escritório Bresciani e Almeida Sociedade de Advogados.

Clique aqui para ler o acórdão
Processo 1000067-89.2023.5.02.0444

Por Renan Xavier

fonte: https://www.conjur.com.br/2023-set-12/mulher-nao-provar-gravidez-demissao-nao-indenizada

STF derruba vínculo de emprego entre rádio e representante que atua como PJ

STF derruba vínculo de emprego entre rádio e representante que atua como PJ

Por Renan Xavier

Por descompasso com a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal sobre o tema, o ministro Kassio Nunes Marques, do STF, cassou uma decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (Grande São Paulo e litoral paulista) que havia reconhecido o vínculo de emprego entre uma rádio e um representante comercial que atua como pessoa jurídica. A corte regional havia entendido que, no caso, estavam presentes os requisitos básicos previstos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Ao acionar o Supremo, a empresa alegou que a contratação, feita por meio de pessoa jurídica, deu-se em razão da natureza do serviço. Além disso, sustentou que o representante comercial se apresenta e oferece seus serviços ao mercado como PJ.

Nunes Marques lembrou que, no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 324, foi fixada a tese de que “é lícita a terceirização de toda e qualquer atividade, meio ou fim, não se configurando relação de emprego entre a contratante e o empregado da contratada”, e que, “na terceirização, compete à contratante: verificar a idoneidade e a capacidade econômica da terceirizada e responder subsidiariamente pelo descumprimento das normas trabalhistas, bem como por obrigações previdenciárias, na forma do artigo 31 da Lei 8.212/1993”.

O ministro pontuou que, ao reconhecer a relação de emprego, o TRT-2 não seguiu o entendimento que admite a validade constitucional da terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas.

Sócio do escritório Caputos, Bastos e Serra Advogados, Ademir Coelho Araújo atuou na defesa da rádio. Para ele, a decisão reforçou a posição do STF de fazer observar o entendimento, firmado sob o regime da repercussão geral, de que “é lícita a terceirização de qualquer atividade, reconhecendo a legalidade da contratação feita não apenas com base na Consolidação das Leis do Trabalho, mas também tendo por fundamento a legislação civil”.

Por Renan Xavier

Clique aqui para ler a decisão
RCL 57.097

TST: Interlocutor pode gravar conversa de forma clandestina para comprovar fatos

TST: Interlocutor pode gravar conversa de forma clandestina para comprovar fatos

A gravação feita por um dos interlocutores para comprovar um fato de seu interesse não afronta o devido processo legal. Com esse entendimento, a 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho validou uma gravação clandestina apresentada por um motorista de caminhão para demonstrar que recebia valores “por fora” de uma empresa de transportes.

Na ação, o motorista disse que recebia comissões mensais, mas a empresa lançava tais valores nos contracheques como pernoites ou alimentação. Ele pediu a integração dessas parcelas ao seu salário.

Para comprovar sua alegação, o autor apresentou um arquivo de áudio de uma conversa na qual um analista de recursos humanos da empresa confirmava a prática de diluir os valores da comissões como se fossem outras parcelas.

A sentença concluiu que o áudio era prova lícita, pois foi gravado por um dos interlocutores da conversa. O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região manteve a decisão e acrescentou que os demais elementos também confirmavam o pagamento de valores “por fora”. Com isso, a empresa foi condenada a integrar as comissões para pagamento das diferenças nas demais parcelas salariais, como 13º e férias.

O ministro Alberto Bastos Balazeiro, relator do caso, reafirmou a jurisprudência de diversas turmas do TST e validou a gravação como prova. Ele também apontou que só seria possível alterar as conclusões do TRT-15 por meio do reexame de fatos e provas, o que não é possível nesse momento processual. Com informações da assessoria de imprensa do TST.

Clique aqui para ler o acórdão
AIRR 10280-62.2020.5.15.0074

STF cassa decisão do TRT-9 que declarou vínculo de emprego de motorista

STF cassa decisão do TRT-9 que declarou vínculo de emprego de motorista

É válida a terceirização e qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, desde que seja mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante. 

A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, reiterou o entendimento da corte no julgamento do Tema 725 e na ADPF 324 para cassar decisão proferida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região que negou ação anulatória de vínculo de emprego atestado pelo agente de fiscalização da Secretaria de Fiscalização do Trabalho.

No caso analisado, uma empresa de transporte de passageiros foi fiscalizada pela Agência Nacional de Transportes Terrestres e o auditor identificou vários trabalhadores sem registro em carteira de trabalho. Um deles, inclusive, estava recebendo seguro desemprego.

Em sua defesa, a empresa afirmou que o trabalhador que estava recebendo seguro desemprego era um prestador de serviços sem vínculo empregatício. A Justiça do Trabalho, entretanto, não acatou os argumentos da companhia.

Na reclamação ajuizada no STF, a empresa sustentou que o contrato de prestação de serviço firmado com o trabalhador é lícito. Também defendeu que no caso em questão não existem os requisitos para reconhecimento do vínculo empregatício como habitualidade e subordinação e que a decisão do TRT-9 desrespeita entendimento do STF sobre a matéria. 

Ao analisar o caso, a ministra Cármen Lúcia deu razão à empresa. “Julgo procedente a presente reclamação para cassar a decisão proferida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região e determinar outra seja proferida, apreciando-se o mérito recursal com observância do decidido por este Supremo Tribunal na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 324/DF”, resumiu a ministra.

A empresa foi defendida pelo advogado Marcelo Mokwa dos Santos, do escritório Santos & Santos Advogados.

Clique aqui para ler a decisão
Rcl 61.867

Por   repórter da revista Consultor Jurídico.

Justiça em números: Com 31,5 milhões de casos novos, Poder Judiciário registra recorde em 2022

Justiça em números: Com 31,5 milhões de casos novos, Poder Judiciário registra recorde em 2022

Os brasileiros nunca acessaram tanto o Poder Judiciário quanto em 2022. Ingressaram na Justiça, nesse período, 31,5 milhões de ações, o que corresponde a um incremento de 10% em relação ao ano anterior. O volume é recorde da série histórica, conforme as estatísticas que constam da última edição do “Relatório Justiça em Números”, com base nos dados consolidados pelo Conselho Nacional de Justiça ao longo dos últimos 14 anos.

Segundo consta do trabalho, apresentado nesta terça-feira (28/8), durante a 2ª Reunião Preparatória para o 17º Encontro Nacional do Poder Judiciário, o recorde é efeito da retomada dos níveis de demanda observados no período pré-Covid-19, bem como do aumento do acesso à Justiça. Ao se considerar apenas as ações ajuizadas pela primeira vez em 2022 — sem, portanto, os casos em grau de recurso e as execuções judiciais —, o total é de 21,3 milhões de processos, índice 7,5% maior do que no ano anterior.

Em 2022, foram baixados 30,3 milhões de processos, o que também corresponde a um incremento considerável: crescimento de 10,8% em relação ao período anterior. Principal fonte das estatísticas oficiais do Poder Judiciário, o relatório mostra ainda que o total de casos julgados no ano passado atingiu 29,1 milhões, um aumento de 2,9 milhões (10,9%) em relação a 2021.

Tramitaram no Judiciário brasileiro 81,4 milhões de processos em 2022, dos quais 17,7 milhões estavam suspensos, sobrestados ou em arquivo provisório, aguardando alguma situação jurídica futura. Desconsideradas essas ações, ao fim do ano restavam ainda 63 milhões de ações judiciais em tramitação.

 

Arrecadação e despesas
Como esperado, houve um aumento nas despesas do Poder Judiciário em 2022, ano que representou a normalização após dois anos de epidemia e o consequente esquema de trabalho remoto nos tribunais brasileiros. “Esse é um ano de retomada, tanto em processos quanto, em consequência, também dos custos, com a volta dos serviços presenciais”, salientou a diretora executiva do Departamento de Pesquisas Judiciárias do CNJ, Gabriela Soares.

As despesas totais da Justiça brasileira somaram R$ 116 bilhões, aumento de 5,5% em relação ao ano anterior. Contudo, desconsiderado o efeito da inflação, o gasto do ano passado foi equivalente ao registrado sete anos atrás, em 2015. Em decorrência da atividade jurisdicional, os cofres públicos receberam durante o ano de 2022 R$ 67,85 bilhões, ou seja, um retorno de 58% das despesas efetuadas.

Desse total arrecadado, R$ 33 bilhões decorrem do pagamento de dívidas por execução fiscal e R$ 19,7 bilhões, do recolhimento de custas. Também estão incluídas nesse total outras receitas, como as cobradas em impostos, em execução previdenciária, em execuções de penalidades impostas pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho e em Imposto de Renda.

De acordo com o “Justiça em Números”, o Judiciário brasileiro presta serviços gratuitos à população, sem cobrança de custas, em quase metade das ações: 21,9% dos casos em tramitação são criminais ou de Juizados Especiais, em que não incidem cobranças; e, entre os demais processos, 29% tiveram concessão de assistência judiciária gratuita.

Novo painel
Na apresentação do relatório, entre as novidades anunciadas pela juíza auxiliar da Presidência do CNJ e coordenadora do Departamento de Pesquisas Judiciárias do CNJ, Ana Lúcia Aguiar, está a tradução do “Justiça em Números” para o inglês e o espanhol.

A coordenadora do DPJ destacou ainda o lançamento de nova versão do Painel Justiça em Números. “Em 2022, nós lançamos o painel de estatísticas que tem os dados processuais, mas ainda nos faltavam os dados de receitas, despesas e os dados de pessoal, que agora foram incluídos.”

A magistrada também mencionou algumas mudanças metodológicas na produção do relatório. Neste ano, pela primeira vez os termos circunstanciados (TCO) passaram a ser computados nas estatísticas judiciárias nacionais, por se tratarem de procedimentos resolvidos por meio de decisão.

No relatório, foram consolidadas informações referentes a 91 órgãos do Poder Judiciário, elencados no artigo 92 da Constituição de 1988, excluídos o Supremo Tribunal Federal e o CNJ, que possuem estatísticas à parte.

Dessa forma, o “Justiça em Números” contempla dados dos 27 Tribunais de Justiça estaduais (TJs); dos seis Tribunais Regionais Federais (TRFs); dos 24 Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs); dos 27 Tribunais Regionais Eleitorais (TREs); dos três Tribunais de Justiça Militar Estaduais (TJMs); do Superior Tribunal de Justiça; do Tribunal Superior do Trabalho; do Tribunal Superior Eleitoral  do Superior Tribunal Militar. Com informações da assessoria de imprensa do CNJ.

Clique aqui para ler a íntegra do “Relatório Justiça em Números 2023” 

STF cassa decisão do TRT-9 que declarou vínculo de emprego de motorista

TRT02: Motorista que dirigia caminhão defeituoso deve ser indenizado, diz juíza

Uma empresa que atua no setor de transporte de produtos químicos foi sentenciada a pagar uma indenização por danos morais no valor de R$ 5 mil após ser considerada culpada por colocar um motorista de caminhão para dirigir um veículo com condições precárias de segurança. O veredito foi emitido pela 13ª Vara do Trabalho de Guarulhos, em São Paulo.

O trabalhador, cuja jornada de trabalho envolvia deslocamentos por cidades do interior de São Paulo e também para outros estados, enfrentou sérios riscos devido à falta de manutenção apropriada no veículo que o foi oferecido. De acordo com os registros apresentados, o caminhão apresentava problemas nos freios, na capa, no tapete e não contava sequer com cinto apropriado para amarrar a carga, que levava produtos químicos perigosos.

A empresa, em sua defesa, refutou as alegações feitas, transferindo a responsabilidade para o motorista quanto à verificação das licenças do veículo. O motorista, por sua vez, argumentou que frequentemente apontava as necessidades de manutenção através de relatórios de inspeção com diversas observações, mas que suas solicitações não eram atendidas. No processo, a empregadora anexou também uma lista de inspeção de frota na qual o trabalhador destacava que o veículo estava apresentando vazamentos e níveis inadequados.

Um depoimento de uma testemunha ressaltou as condições deploráveis do caminhão modelo 1620, descrevendo-o como “meia vida” com “estado de velho”“pneu careca, faltando os grampos, palhetas, sem freio, banco com assento repartido e sem espuma”.

Na decisão proferida pela juíza Sheila Lenuza Amaro de Souza, ficou evidente que a empresa infringiu a lei ao submeter o motorista a condições de trabalho inadequadas, comprometendo sua dignidade e segurança. A juíza salientou que tais atitudes constituem um ato ilícito e colocam em risco não apenas a vida do autor da ação, mas também a vida de todos os demais usuários das rodovias. Com informações da assessoria de imprensa do TRT-2.

Processo 1000389-84.2023.5.02.0323

STF: Gilmar derruba decisão que reconheceu vínculo de escritório e advogada

STF: Gilmar derruba decisão que reconheceu vínculo de escritório e advogada

Ministro considerou que o TRT desconsiderou a condição de associada da advogada e não observou a jurisprudência do Supremo sobre a matéria.
O Ministro Gilmar Mendes, do STF, cassou decisão do TRT da 3ª região que havia reconhecido o vínculo de emprego de uma advogada com um escritório de advocacia. Segundo o decano, a insistência da Justiça do Trabalho em aplicar a súmula 331 do TST gera insegurança jurídica e compromete avanços econômicos e sociais.
A decisão se deu na RCL 55.769, em que um escritório alegava que a decisão do TRT teria violado o entendimento do Supremo sobre a licitude de outras formas de organização da produção e de pactuação da força de trabalho além do regime da CLT (Tema 725 da repercussão geral).
Contrato-realidade
De acordo com os autos, a advogada havia firmado contrato de associação, averbado pela seccional da OAB, sem prova de coação ou fraude para sua celebração. Na ação trabalhista, ela alegou que estariam presentes todos os requisitos da relação de emprego, como cumprimento de jornada de trabalho e diretrizes definidas pelo escritório para execução de suas atividades, além de inserção dos seus serviços na organização produtiva da empresa.
Para o TRT de Minas Gerais, a relação de emprego, por se tratar de um contrato-realidade, não se apega a registros formais, mas se revela por meio dos requisitos dispostos na CLT.
Em sua decisão, o ministro Gilmar Mendes afirmou que, apesar do entendimento firmado pelo STF no julgamento da ADPF 324 e do RE 958.252, a Justiça do Trabalho insiste em aplicar a súmula 331 do TST, que distingue a terceirização na atividade-meio e na atividade-fim.
“Cumpre registrar que, por ocasião do julgamento da ADPF 324, apontei que o órgão máximo da justiça especializada (TST) tem colocado sérios entraves a opções políticas chanceladas pelo Executivo e pelo Legislativo. Ao fim e ao cabo, a engenharia social que a Justiça do Trabalho tem pretendido realizar não passa de uma tentativa inócua de frustrar a evolução dos meios de produção, os quais têm sido acompanhados por evoluções legislativas nessa matéria.”
Para o relator, essa conduta gera insegurança jurídica e compromete avanços econômicos e sociais, frustrando a evolução dos meios de produção.
“Dessa forma, os únicos produtos da aplicação da então questionada súmula 331/TST, no contexto da distinção entre atividade-meio e atividade-fim, mostrou-se ser a insegurança jurídica e o embate institucional entre um tribunal superior e o poder político”, concluiu o decano.
Processo: RCL 55.769
Leia a decisão.
Informações: STF: https://www.migalhas.com.br/quentes/391702/gilmar-derruba-decisao-que-reconheceu-vinculo-de-escritorio-e-advogada
SEM VÍNCULO: Lula sanciona lei que afasta vínculo de emprego entre pastor e igreja

SEM VÍNCULO: Lula sanciona lei que afasta vínculo de emprego entre pastor e igreja

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou, na última sexta-feira (4/8), a Lei 14.647/2023, que estabelece a inexistência de vínculo empregatício entre entidades religiosas e seus membros. A norma foi publicada nesta segunda-feira (7/8).

Conforme o texto, o regime de trabalho da CLT não vale para os chamados “ministros de confissão religiosa” — como pastores, padres, rabinos, imames e babalorixás —, nem “membros de instituto de vida consagrada, de congregação ou de ordem religiosa, ou quaisquer outros que a eles se equiparem”, mesmo que se dediquem a atividades ligadas à administração da organização religiosa ou que estejam em formação ou treinamento.

Colocando no papel
O entendimento já era dominante na jurisprudência. Como já mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, o Tribunal Superior do Trabalho já reiterou diversas vezes a inexistência de vínculo. Ao menos as , 6ª e  Turmas já negaram a relação de emprego entre pastores e igrejas. O sistema da Corte não permite a filtragem necessária para traçar todos os precedentes quanto ao tema.

Os Tribunais Regionais do Trabalho adotam o mesmo posicionamento majoritário do TST. Entre as cortes que já proferiram decisões desfavoráveis aos líderes religiosos reclamantes, estão TRT-1TRT-2, TRT-3, TRT-4, TRT-7, TRT-14TRT-15TRT-18 e TRT-24.

 

Segundo ele, as instituições religiosas e seus sacerdotes têm um “relacionamento transcendental”, fruto de uma “vocação sobrenatural”, na qual o templo “é o instrumento humano para o cumprimento da missão existencial de vida”. Ou seja, não existe uma “contrapartida laboral”.

Nas palavras de Thiago Rafael Vieira, presidente do Instituto Brasileiro de Direito e Religião (IBDR), o líder religioso “não tem um chefe” — pelo menos não uma figura humana: “O chefe dele é a divindade”.

Além disso, as remunerações eventualmente recebidas não têm natureza salarial. Os pastores, por exemplo, recebem a prebenda, que funciona mais como uma ajuda de custo.

Exceção à regra
A nova lei também prevê que o vínculo empregatício pode ser reconhecido “em caso de desvirtuamento da finalidade religiosa e voluntária”.

Tal regra busca proteger sacerdotes que sejam tratados mais como funcionários do que como líderes espirituais, em claro desvio de suas funções — por exemplo, pastores que precisem cumprir horários específicos, recebam ordens não espirituais de superiores, tomem advertências e suspensões, sofram descontos na remuneração, recebam contracheque, façam hora extra ou até mesmo atendam telefones, pintem igrejas e deem aulas que não de ensino religioso.

Exceções do tipo também já eram reconhecidas pela jurisprudência. A 3ª Turma do TST, por exemplo, já reconheceu o vínculo de emprego de um pastor da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd) que recebia prêmios — como casa ou automóvel — de acordo com sua produtividade e era punido caso não cumprisse metas de arrecadação de ofertas e dízimos.

Desjudicialização
Na visão de Garcia, a nova lei respeita a inviolabilidade de crença e a separação Igreja-Estado. De acordo com ele, a regulamentação “contribuirá efetivamente para a drástica redução de ações judiciais na Justiça do Trabalho pleiteando o vínculo laboral com entidades espirituais”.

Vieira ressalta que, mesmo com o entendimento consolidado pela jurisprudência, a falta de uma lei poderia gerar dúvidas. Assim, partes e advogados que não conheciam a doutrina do Direito Religioso acabavam ajuizando demandas infrutíferas. Por isso, ele vê a nova lei como “um bom filtro para que não se entre com ações na Justiça”.

A advogada Silvana Neckel, que atua com Direito Religioso e Canônico e é conselheira e diretora executiva do IBDR, lembra que processos do tipo chegavam a gerar sentenças contrárias à jurisprudência dominante: “Em primeiro grau de jurisdição, eram prolatadas algumas decisões que reconheciam este vínculo empregatício”.

Assim, para ela, a lei, ao “regular as situações vivenciadas nas diversas entidades religiosas”, traz segurança jurídica e, “por certo, reduzirá significativamente os litígios judiciais”.

Por José Higídio

Fonte: https://www.conjur.com.br/2023-ago-08/lei-afasta-vinculo-emprego-entre-pastor-igreja

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